segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Sem cera

Por puro capricho de Deus, depois que me divorciei em Janeiro de 2000, tem acontecido algo de extraordinário no meu ministério de oração. Tenho atendido tanto homens como mulheres que vem de relacionamentos sofridos, cuja, feridas estão tão vivas que parecem não ter remédios para cicatrizá-las. Outras vezes aparecem casais que já estão separados, ambos manifestam o desejo de reconciliação, entretanto no ato da separação usaram armas tão letais contra o outro, que causaram terríveis feridas no amor. Nesse caso o casal se distancia tanto, que a volta é como caminhar num labirinto, damos volta em torno de nós mesmo e não achamos saída para entrar no coração do outro. Se eu pudesse promulgaria uma lei para reger os relacionamentos: “É proibido fazer o outro sofrer”. Hum! Que lei mais boba, boba sim, porque já tem uma perfeita, só que os casais insistem em não cumpri-la. “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amo”. (Jo 15,12 ) Então o que eu diria para os casais? Tanto para os que estão a caminho do matrimônio, como os que já estão em matrimônio. “É proibido abortar o sonho do outro”. Nesse caso ambos precisam ser sinceros. A palavra “sincero” vem de “sem cera”. Cera que era usada na antiguidade para fazer máscara. É atrás da máscara que a realidade se esconde, para dar lugar a fantasia. Então para um relacionamento ser frutuoso, antes é preciso que homem e mulher apresentem-se um ao outro sem cera, pois o sonho do outro é sagrado e merece respeito. Afinal, porque estou escrevendo isso? Lá venho eu fazendo pra mim mesmo, perguntas quase sem respostas. Tem hora que da vontade de rir de mim mesmo. Meus pensamentos ficam questionando meus pensamentos a procura de resposta. Eu sempre faço como os bovinos! Calma que eu explico. O boi pasta o dia inteiro, durante a noite rumina o alimento ingerido, ele regurgita para a boca o capim e o mastiga novamente. Durante um dia de atendimento de oração, eu escuto várias histórias, que em um determinado momento, as regurgito de volta a memória para mastigá-las. Às vezes sou surpreendido com perguntas que me obrigam a tomar decisões rápidas para responder. Sabe aquela resposta que você tem que dar, quase que em fração de segundo, sem ter o direito de errar? Pois é, sem ter o direito de errar, porque o erro compromete a vida da pessoa que te pergunta. Dependendo de sua resposta, você ressuscita o monstro, ou desperta o anjo na vida da pessoa. Um dia atendi uma senhora de meia idade, ela chama-se “Carência”, ela era casada com um senhor um pouco mais velho. “Carinhoso” é o nome dele. “Carência me contou sua história, para fazer uma pergunta: “Depois de mais de vinte anos de casado, meu marido resolveu sair de casa, envolveu-se com outra mulher, que por sinal era nossa vizinha, chamava-se “Paixão”, era bem mais nova que eu, porém falavam por aqui que ela tinha uma doença grave. Dizendo-se apaixonado por ela, foram morar juntos. Mudou-se para uma cidade distante, Ilusolândia. Nunca vi essa cidade no mapa. Depois de três anos, a doença de “Paixão” agravou e ela veio a óbito. Com seis meses de viuvez, ele começou um romance com uma tal “Soledade”, que morava na mesma cidade. Segundo ele, o Romance foi curto, pois “Soledade era muito deprimida. Quando eu menos esperava, “Carinhoso” me ligou dizendo que queria voltar para casa. pois “Saudade”, nossa filha caçula, tinha convencido ele, que o lugar dele era do meu lado e do lado dos filhos. Então eu disse: pode voltar. Três meses se passaram e ele não voltou e não ligou mais. Num domingo de madrugada o telefone quebra o silêncio da noite. Era ele me fazendo um pedido: “você podia vir aqui em Ilusolândia me buscar pra casa, porque estou com vergonha de voltar e encarar você e meus filhos, depois do que eu aprontei. Ela então me disse: antes de ira buscá-lo, quero te pedir uma opinião, o senhor acha que devo ir buscar meu marido? Eu respondi em alta voz e bom tom: nesse caso não! Já esperando a réplica da pergunta, escutei: “Mas o Pai amoroso não foi ao encontro do filho pródigo”? Pergunta que parece de difícil resposta no caso de “Carência”, entretanto e muito simples. No caso do filho pródigo, houve o reconhecimento do erro e um pedido formal de perdão, sinalizando que o filho encontrava-se em sincero arrependimento. Ele voltava, não só porque tinha perdido tudo, mas porque a generosidade do pai para com os empregados já lhe projetava a volta com retorno satisfatório. No caso do marido dessa senhora, não houve arrependimento, quando muito ele teve remorso. O remorso não macera o coração na humildade, mas o faz inchar de orgulho. O orgulho deixa sempre a pessoa sujeita a repetir o mesmo erro. Quanto os conflitos aparecerem, porque conflitos aparecem onde humanos se relacionam. O orgulhoso não sabe administrar, ele tem sempre uma válvula de escape. “Eu não pedi pra voltar, foi você que foi me buscar”. Pior que foi mesmo. “Você me aceitou de volta, porque quis.” Pior que foi! Pois não houve arrependimento, nem pedido de perdão. Pois bem, uma pergunta me pôs a marretar minha cabeça, como malhar o ferro na bigorna, Quais os sinais de um arrependimento sincero? Sinais que não precisam de palavras para explicar, que são como sementes que caem à margem do caminho da volta, que com certeza há de florir para embelezar o jardim da vida a dois. O primeiro sinal de quem se arrependeu e quer voltar e o gesto de arrumar as malas. Ai surge outra pergunta: arrumar as malas com que, sendo que quem saiu sempre acaba perdendo tudo que levou? Quem saiu tem a impressão que levou tudo, quem é deixado fica com a sensação de quem tudo perdeu. Mas acontece que quem saiu não leva nada, as malas estão vazias, se levasse alguma coisa nunca sentiria a necessidade da reconciliação. Deve-se, arrumar as malas com aquilo que você deixou quanto partiu. Não pode esquecer-se de colocar na mala o amor que você recusou a receber, o carinho que você desprezou, não pode faltar o sonho que você abortou, pois o mesmo é um ótimo remédio para cicatrizar a ferida que você fez e ainda apagar as marcas da machucadura. Quando voltar ao antigo lar, ao antigo não, ao primeiro, não hesite em usar sua mesma chave para abrir a porta, porque quem sempre amou de verdade nunca muda a fechadura. A pessoa sempre vai está disposta a te receber, mesmo que não esteja decidida a deixar você permanecer. Só não seja afoito para entrar, abra bem a porta, deixa a luz entrar antes, para que as realidades encontradas fiquem bem entendidas por você. Não se esquive dos detalhes, perceba que nada mudou desde sua partida, a não ser sua imagem que começou a desbotar nas paredes do coração do outro e que cabe a você retocar com a tinta do amor. Esse desbotamento é quase que normal, pois são causados pela distancia e o tempo. Distancia e tempo que não é geográfica nem cronológica, mas afetiva. É fundamental que eu entenda uma realidade, embora difícil de se admitir, porém, verdadeira, eu sim mudei. Abandonei um ambiente que jorrava amor, para cavar cisterna em terreno árido. Digo isso porque sempre achamos que o outro tem de mudar para atender as exigências nossa. Prepara-te para dar uma resposta, porque essa pergunta não vai faltar: “por onde você andou”? Responda tudo, não esqueça nada, nenhum detalhe, não deixe margem para o mistério, pois ele é inimigo da confiança. Hei, espere, tenha calma, respire fundo, pense no que você vai falar! O outro não quer saber de suas paixões vividas de suas loucuras de “amor”. Isso não revela um coração arrependido, mas um aventureiro de ocasião. Lembrei de um trecho de uma música de Roberto Carlos, onde ele tem que dar essa mesma resposta, veja bem como ele conta com detalhes por onde andou, quando se ausentou do amor. “onde andei não deu para ficar, porque aqui, aqui é meu lugar, eu voltei pras coisas que eu deixei, eu voltei”! Isso é tudo que o outro quer ouvir, pois demonstra que nas paixões onde seu coração singrou, não encontrou porto seguro para se atracar. É amigo! O caminho de volta e duro, tão diferente da estrada larga de retas intermináveis de quando se sai. Não se apavore, não desanime, apesar de serem passos dados no chão da indecisão. Porque você não sabe se o outro ainda mora no paraíso que você abandonou. O caminho é duro, porque é real, não está pavimentado com ilusões. Todavia, você há de convir comigo em uma coisa, todo caminho que nos leva a um paraíso paradisíaco, nunca acaba numa via pavimentada, tem sempre aquela entrada que não da mais pra ir de carro. É uma trilha cheia de obstáculos, que desemboca num lugar que é quase um céu. Só não digo que é o céu, porque tem míninos detalhes para serem ajustados. Que ajustes são esses? Tenho vontade de rir com essa pergunta, não, não é nada pessoal. É porque me lembrei de outra história, um amigo me surpreendeu dizendo: “Vitório, reze por mim, pois sai de casa, acabou meu casamento e estou saindo com coração ferido”. Seis meses depois ele me ligou dizendo: “Vitório reze por mim, voltei pra casa, optei por restaura a velha estrada do que abrir um caminho novo, confesso que estou me sentindo um pássaro fora do ninho em minha casa”. Eu respondi pra ele: “Você voltou não porque saiu com coração ferido, mas retornou porque feriu seu coração nos lugares por onde andou. Tenha paciência o amor cura todas as feridas, ainda bem que você encontrou o paraíso que abandonastes e o amor de braços abertos a te acolher”. Deu pra entender o que é arrependimento? As atitudes têm que demonstrar para o outro que houve mudança, que você é o príncipe, ou princesa com que o outro sonhou. Não o sapo e a sapa do pesadelo do outro.

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